
Eita tarefa difícil essa, hein?!!?
O autoconhecimento é muito importante para qualquer ser humano, porém é essencial para um ator. Mas como fazer isso? Por onde começar?
Cada um tem o seu processo e isso é muito particular, mas a terapia, seja individual ou em grupo, na maioria das vezes é imprescindível.
Quando a gente vai se conhecendo, percebemos que é um processo doloroso e até mesmo sombrio, porém muito gratificante. Isso porque na sociedade em que vivemos, temos que ser “normais”. E o que é ser normal? Tudo que foge ao senso comum, tudo que fazemos e é considerado fora das convenções sociais é tachado como atitude Anormal, incorreta, estranha. Mas o que é errado? Porque errar não é permitido? “Bom mesmo é aquele que sabe tudo, acerta tudo”. Sabe tudo o que?
Somos educados a nos penitenciar por qualquer conduta fora do normal, do convencional. Essa ditadura do “normal” impede com que nós enxerguemos que surpreender é muito interessante e que errar é essencial para o crescimento de alguém. Dificilmente crescemos e aprendemos quando estamos felizes e tudo dá certo na vida. O sofrimento e o erro são os combustíveis necessários para que nós voltemos a prestar atenção em nós mesmos, é a oportunidade que temos de nos conhecer melhor, de encontrar algo jamais acessado anteriormente.
Ninguém é “normal”, somos muito complexos. Entretanto nos fazemos quase que iguais em atitudes e condutas. Temos medo de acessar parte de nosso inconsciente, temos receio de encarar o nosso outro lado, o qual está ali nos mostrando que sim, somos capazes de tudo. Porém, se nos permitirmos acessar, adquirindo essa consciência, teremos maior controle sobre nós mesmos, conviveríamos melhor com as diferenças e julgaríamos menos os outros.
Quando Murray Stein escreve sobre personas e sombras a partir da literatura de Jung, nos faz repensar quem somos e a imagem que queremos passar de nós mesmos:
“A maioria das pessoas vêem-se como decentes e conduzem-se de acordo com as regras da decência e da correção em seus círculos sociais, e só revelam elementos sombrios por acidentes, em sonhos ou quando impelidas a extremos. Para elas, o lado sombrio do ego ainda funciona, mas através do inconsciente, manipulando o meio ambiente e a psique para que certas intenções e necessidades sejam satisfeitas de um modo socialmente aceitável. O que o ego quer na sombra, entretanto, não é necessariamente mau em si e de si e, com frequência, a sombra, uma vez enfrentada, não é tão perversa quanto se imaginou.” (STEIN, 1998, p. 99)
Acredito que nós atores temos a obrigação de acessar a sombra, trazendo para a consciência elementos e sentimentos que nos abram possibilidades, que nos permitam viver a história de um personagem com verdade, mapeando as sensações no corpo, através da união de pensamento e estado físico, e assim perder o controle do “como vai chegar”, somente tendo consciência de “onde vai chegar”.
Artistas convivem muito mais do que em qualquer outra profissão com os jogos do ego. Aplausos, elogios, reportagens, fãs, etc. É difícil, não estou aqui pra dizer como é fácil ou como eu consigo fazer de outro jeito. Não, é realmente muito difícil ter a consciência de que aquele elogio não me torna um ator melhor, que os aplausos são um reconhecimento maravilhoso, mas, provavelmente, não me ajudarão no meu próximo trabalho, pelo contrário, pode ser que me atrapalhe e infle meu ego a tal ponto que, mesmo sabendo que o trabalho de ator é contínuo e incessante, eu me coloque em uma zona de conforto perigosa.
Indicação de livro: Técnica para o ator: A arte da interpretação ética (Uta Hagen)
Agradecimento: Cintia Di Giorgi e grupo de estudos.