segunda-feira, 25 de julho de 2011

Memória Emotiva (parte 3)


II- Técnica para o ator- A arte da interpretação ética, Utta Hagen com Haskel Frankel

"Há professores que realmente forçam os atores a lidar com algo já enterrado (sua reação à morte do pai ou da mãe, ou ao trauma de um desastre). O resultado é histeria ou algo pior, o que, na minha opinião, é antiarte. Não estamos procurando psicoterapia. Se você se sente mentalmente doente ou perturbado e acha que precisa de psicoterapia, deve, sem dúvida, procurar um médico ou um terapeuta, não um professor de teatro."

"Quando digo que você deve ter distância em relação a experiência que deseja usar como ator, não estou me referindo ao tempo, mas à compreensão. Em 1938, tive uma experiência com a morte de alguém que eu amava profundamente, uma experiência que ainda não consigo superar por completo ou discutir, e que por isso não posso usar como atriz. No entanto, também tive uma experiência pela manhã que fui capaz de digerir e empregar à noite."

"As próprias ações, verbais ou físicas, podem gerar fortes emoções e às vezes ser tão estimulantes para uma descarga emocional como qualquer objeto interno relembrado. (Quando digo objeto interno, estou me referindo a um objeto não exteriormente presente, mas a um que existe e é representado apenas na mente.) O simples ato de bater meu punho na mesa pode provocar um sentimento de raiva. Uma razão ou motivação lógica para agir assim pode carregar a ação para mim. Uma motivada súplica por perdão, a ação física ou verbal de implorar, acariciar ou apertar podem produzir um rio de lágrimas. A ação de fazer cócegas suaves em alguém pode me fazer disparar um ataque de riso. Não estou recomendando que você adquira o hábito de predeterminar a expressão da ação a fim de encontrar a emoção, mas a sensação ou a emoção estão alimentando continuamente a ação, a qual, por sua vez, fomenta a emoção."

" A memória sensorial, a lembrança de sensações físicas, é freqüentemente mais fácil para o ator do que a lembrança das emoções. Se nós, como atores, temos males do ofício, um deles talvez seja a hipocondria. Nós, em grande parte, estamos interessados em nossas sensações e as examinamos, discutimos sobre elas e às vezes lhe damos mais importância do que talvez seja usual para alguém que não seja ator. Não há nada de errado nisso, contanto que lembremos que essas sensações podem ser expressas de maneira útil. Alguns atores são tão sensíveis e sugestionáveis que uma simples conversa sobre dor, calafrio ou coceira pode convencê-los de que têm aflição semelhante. Esses atores são exceção. A maioria de nós deve aprender a técnica correta de produzir sensações, de modo que estejam prontamente disponíveis para nós no palco.
Como o corpo tem um senso inato de verdade, devemos aprender alguns fatos fisiológicos para evitar a violação da verdade física. Às vezes, com um simples ajuste corporal incorreto, podemos destruir nossa fé numa sequência inteira de nossa existência no palco."

"Em suma, minha opinião é que um ator que esteja atuando corretamente deve, no plano ideal, ser a criatura mais saudável e menos neurótica do planeta, pois está usando sua vida sensorial e emotiva ao exprimi-la com um propósito artístico. Se ele está trabalhando no teatro, tem a oportunidade de fazer uso de suas ansiedades, hostilidades, ternura reprimida por meio da expressão artística. Acho que talvez as pessoas nos chamem de neuróticos, fúteis ou exibicionistas porque não sabem que muitos atores talentosos são assim apenas porque estão sem oportunidades de trabalho e, por isso, manifestam sua necessidade de expressão no álcool ou em condutas irracionais- ou talvez- porque essas pessoas tenham inveja de que, quando realmente atuamos, podemos fazer o que elas, quando muito, apenas sonham em fazer."

Memória Emotiva (parte 2)


Alguns trechos sobre Memória das emoções do livro "A preparação do ator", de Constantin Stanislavski.


"Dessas impressões, forma-se uma memória de sensações vasta, condensada, mais ampla e mais profunda de experiência correlata. É uma espécie de síntese da memória em grande escala. É mais pura, mais condensada, compacta, substancial e cortante do que os acontecimentos de fato."

"O tempo é um esplêndido filtro para os nossos sentimentos evocados. Além disto, é um grande artista. Ele não só purifica, mas também transmuta em poesia até mesmo as lembranças dolorosamente realistas."

"Você é capaz de imaginar como é realmente a nossa memória emocional? Imagine um certo número de casas, com muitos quartos em cada casa, em cada quarto inúmeros armários, prateleiras, caixas, e, em algum lugar, numa delas, uma pequena miçanga. É bem fácil achar a casa certa, o quarto, o armário, a prateleira. Mas já é mais difícil encontrar a caixa exata. E onde estará o olhar penetrante, capaz de descobrir aquela pequenina conta que se desprendeu hoje e rolou, por um momento lampejou e, depois, perdeu-se de vista? Só a sorte a encontrará de novo."

"Sempre e eternamente, quando estiverem em cena, você terá de interpretar a si mesmo. Mas isto será numa variedade infinita de combinações de objetivos e circunstâncias dadas que você terá preparado para o seu papel e que foram fundidos na fornalha da sua memória de emoções. É este o melhor e único material verdadeiro para a criatividade interior. Utilize-o e não confie em nenhuma outra fonte para abastecer-se."

"Outra razão por que devem apresar essas emoções repetidas é que um artista não constrói seu papel com a primeira coisa que lhe está à mão. Seleciona com o máximo de cuidado dentre suas lembranças e elege das experiências vivas as mais sedutoras. Para tecer a alma da pessoa que vai retratar, utiliza emoções que lhe são mais caras do que suas sensações cotidianas. Podem imaginar campo mais fértil para a inspiração? O artista torna o que de melhor existe nele e leva-o para o palco. A forma há de variar, conforme as necessidades da peça, mas as emoções humanas do artista permanecerão vivas e estas não podem ser substituídas por nenhuma outra coisa."

"Não sei. As coisas do subconsciente não são do meu terreno. Além disso, não creio que se deva destruir o mistério em que nos habituamos a envolver nossos momentos de inspiração. O mistério tem beleza própria e é, por si só, um grande estímulo à criatividade"

"Isso, entretanto, não deve levá-lo a concluir que tem o direito de subestimar a importância dos sentimentos repetidos, sacados na memória emocional. Pelo contrário, deve dedicar-se inteiramente a eles, pois são o único meio pelo qual poderá exercer qualquer grau de influência na inspiração. Permita-me recordar-lhes o nosso princípio cardeal: Por meios conscientes alcançamos o subconsciente."

"Nunca se perca no palco. Atue sempre em sua própria pessoa, como artista. Nunca se pode fugir de si mesmo. O instante em que você se perde no palco marca o ponto em que deixa de verdadeiramente viver seu papel e o início de uma atuação exagerada, falsa. Assim, por mais que atue, por mais papéis que interprete, nunca conceda a si mesmo uma exceção à regra de usar sempre os próprios sentimentos. Quebrar essa regra é o mesmo que matar a pessoa que você estiver interpretando, pois a estará privando de uma alma humana, viva, palpitante, que é a verdadeira fonte da vida do papel."

"Todas as nossas experiências criadoras são plenas e vivas na razão direta do poder, acuidade e exatidão da nossa memória. Se for fraca, os sentimentos que desperta serão pálidos, intangíveis e transparentes. Não têm valor, no palco, porque não conseguem ultrapassar a ribalta."

"Utilizamos como material criador não só as nossas próprias emoções passadas, mas, também, os sentimentos que experimentamos ao simpatizarmos com as emoções alheias."


Anexarei a este post o link do Arquivo confidencial do Faustão que a Cássia Kiss participou. Vi no facebook do meu amigo Eraldo Júnior e gostei de algumas colocações da atriz. Vale a pena conferir. =)

http://www.youtube.com/watch?v=_S67paevBL0&feature=watch_response